EU TE ENCONTRO
- Mariana milani
- 5 de ago.
- 1 min de leitura

Te encontro.
Na escrita —
sem pontuação, sem final, sem virgula.
Na ausência.
No silêncio que me dobra.
No vácuo que range os móveis às 5h42.
No café que esfria para uma só boca.
Te encontro no aguar solitário das plantas,
na sala escura às três da tarde,
na compulsão por limpar o que não volta.
Te encontro no álbum da Cat Power —
sussurrando Dylan.
Te encontro
no abajur do lado direito desligado,
na escada de três degraus sendo usada,
no reflexo da TV desligada.
Te encontro no olhar do Merlin —
no rim que lhe torce a coluna.
No veterinário dizendo “vai doer um pouco”.
Te encontro na porta do cinema.
Na pipoca pequena.
No prego que entorta na parede.
Te encontro às 3h da manhã,
com o ombro desabando.
No consultório vazio,
no eco de uma sala branca.
Na voz do Rodrigo perguntando sobre a cor da parede —
terra cota.
Respondo: "Sim."
Quero dizer: "cinza, concreto, desmoronando"
Te encontro no andar torto,
na cabeça em curva,
na unha descascada,
no dorso da mão limpando a lágrima
que tem vergonha de cair.
A vida:
segue sua marcha.
Folhas caem.
Pessoas passam.
Madeira estala.
Alarmes tocam.
E eu —
vou te encontrando,
Mari.
Pequenas vitórias
num campo minado.
Se você leu até aqui —
essa é uma delas.
Minha.
Silenciosa.
De pé.
Eu me encontro.
E não duvido:
esse encontro estava escrito
no relógio cego da vida.
Essa é uma trajetória de espelhos:
de mim para mim.
De Mari,
para Ana.









Comentários